sábado, 13 de junho de 2009

Dharma Bums

A pedra contra a qual acampamos era uma maravilha. Tinha dez metros de altura e dez de base, quase um quadrado perfeito, e árvores retorcidas inclinavam-se sobre ela para olhar para nós lá embaixo. A partir da base, projetava-se para a frente, formando um côncavo, de modo que se chovesse estaríamos parcialmente cobertos. "Como foi que essa filhadaputa imensa conseguiu chegar até aqui?"
"Provavelmente foi deixada por uma geleira que se retraiu. Está vendo aquele campo ali coberto de neve?"
"Estou."
"É o que sobrou da geleira. Ou isso ou esta pedra rolou até aqui de montanhas pré-históricas incríveis que não temos condições de entender, ou talvez tenha vindo parar aqui quando a porra da cadeia de montanhas emergiu do solo na sublevação da costa do período Jurássico. Ray, quando você está aqui você não está acomodado em uma casa de chá de Berkeley. O começo e o fim do mundo estão bem aqui. Olhe só para todos estes budas cheios de paciência nos observando sem dizer nada."
"E você costuma vir aqui sozinho..."
"Passo semanas a fio aqui, igualzinho a John Muir, escalo as montanhas sozinho, seguindo filões de quartzo ou transformando campos floridos em acampamento, ou simplesmente caminhando por aí nu e cantando, e preparo meu jantar e rio."
"Japhy, preciso tirar o chapéu para você, você é o carinha mais feliz do mundo, e também o maior, por Deus, é sim. Com certeza me sinto contente de aprender tudo isto. Este lugar também faz com que eu me sinta devoto, quer dizer, você sabia que eu tenho uma reza, você conhece a minha reza?"
"Qual?"
"Eu me sento e falo, e listo todos os meus amigos e parentes e inimigos um por um, sem me prender a nenhuma raiva ou gratidão nem nada, e digo assim 'Japhy Rider, igualmente vazio, a ser amado igualmente, igualmente um Buda que está por vir', e continuo, digo, a 'David O. Selznick, igualmente vazio, a ser amado igualmente, igualmente um buda que está por vir', apesar de não usar nomes como David O. Selznick, só falo de gente que eu conheço porque quando digo 'igualmente um Buda que está por vir' quero visualizar os olhos da pessoa em questão, como por exemplo Morley, os olhos azuis que ele tem atrás daqueles óculos, quando você pensa 'igualmente um Buda que está por vir' você está pensando naqueles olhos e de repente você vê mesmo a serenidade secreta e a verdade sobre a transformação dele em Buda. E daí você pensa nos olhos dos seus inimigos."

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